Batman: O cavaleiro das TELAS é um ÉPICO
Nós caímos para que possamos usar nossas forças e levantarmos, é o
discurso explícito na trilogia do Batman no cinema e que perpassa seus
personagens e as situações que a fictícia Gotham vivenciou nas três partes
dessa nova ópera contemporânea. No fim temos as diversas distorções que
discursos podem sofrer até as suas realizações práticas, até mesmo numa
produção focada no entretenimento.
Para tal empreitada, depois de formar a base de sua narrativa medular em
já citadas obras do universo do Batman, Christopher Nolan, diretor da trilogia,
aproveitou elementos de novos trechos na vida de Gotham City. Para tal, foi
necessário adaptar, reconstruir o mito, para que o mesmo tornasse mais
confortável na grande tela e a sua redução não soasse confusa. Costurando de
forma coerente as específicas fases para a produção da narrativa, Nolan manteve
a qualidade atingida com o tempo.

Mas de longe é Cavaleiro das Trevas o fio condutor da trama dirigida por
Nolan no encerramento de sua trilogia. Foi a saga No Man´s Land, Terra de Ninguém, entre março e dezembro de 1999,
que serviu de inspiração para a ambientação de boa parte da produção
cinematográfica, assemelhando realidade e fantasia numa costura quase
imperceptível. Nos quadrinhos o evento é seguido do efeito de um terremoto que
atinge Gotham, mas no filme as circunstâncias são de responsabilidade humana.
A saga Legacy, aqui no Brasil
lançada com o título de O Legado do Demônio, de 1996 faz menção direta a Ra´s
Al Ghul e sua Liga das Sombras. De pouca força e significância em sua
publicação de origem, serviu de peso para segurar algumas pontas soltas
fornecidas pelo primeiro filme e muito bem aproveitadas em seu desfecho. A
idéia da relação de Bane com a Liga das Sombras é objetivamente modificada para
funcionar no trabalho de encerramento da trilogia, alternando com informações
de sua contra-parte nos quadrinhos.
Mas o surgimento de Bane está intimamente ligado com a famosa saga Knigthfall, A Queda do Morcego, de abril
de 1993 a agosto de 1994, que convergiu as atenções dos leitores aos
cadenciados eventos de enfraquecimento, derrota, recuperação e vitória do
Batman. A produção cinematográfica ajustou alguns elementos à sua pretensão
narrativa, num momento acrescentando recurso próprio e noutro amoldando os
oriundos dos quadrinhos originais.
Toda essa estrutura teceu a narrativa de Batman: O Cavaleiro das Trevas
Ressurge. Trazendo as ações de Bane e seus escusos planos diante da cidade de
Gotham City e do Batman. O encerramento do filme anterior cria toda uma
situação de paz nascida de uma mentira: a de que Harvey Dent foi íntegro
moralmente e que para isso o imaginário sobre o Batman passaria de herói a
assassino. Tal alternação de discurso, dentro da narrativa, servia a uma lógica
necessidade ética e suas reflexões na moral social desejada.
E com essa alternação de discurso se segue o terceiro filme, onde o
antagonista principal, o maquiavélico Bane, esconde suas verdadeiras intenções
em discursos revolucionários de natureza social e política. Deturpando valores
de “povo”, “liberdade” e emulando uma justiça social no controle da sociedade
pelo crime organizado armado. Bane discursa sobre o conflito de grupos
econômicos extremos, onde a riqueza de uns e a pobreza de tantos justificam a
ação revolucionária, numa paródia nefasta da Revolução Francesa do século
XVIII, fundamentalmente na fase chefiada por Robespierre: O Reino do Terror.
A crise do discurso não é percebida em profundidade pelo herói Batman,
nem mesmo pelo comissário Gordon, ambos preocupados com a ordem social perdida.
Selina Kyle, a Mulher-Gato, é quem vislumbra melhor o embate entre o Status Quo
anterior, de capitalismo e democracia de Gotham City e suas transnacionais, e a
pseudo-revolução de Bane, uma ditadura armada e fundamentada no poder e na
violência. Com certeza a obra ainda abrirá mais questionamentos e reflexões no
campo do discurso ideológico na política, relacionando seus personagens
fictícios com a realidade social em que vivemos.
De todo modo, o desfecho da trilogia se provou um competente épico, com
direito a trilha sonora impactante de Hans Zimmer e reviravoltas tensas que
prenderam seus primeiros expectadores em suas cadeiras por mais de duas horas
nas salas de cinema. Ponderar sobre sua qualidade diante do segundo filme é uma
atividade pouco produtiva, justamente por se tratarem de um mesmo produto,
ligados na pretensão de cunhar nova página na História do cinema.
Savio Roz
Link interessante: http://boitempoeditorial.wordpress.com/2012/08/08/ditadura-do-proletariado-em-gotham-city-artigo-de-slavoj-zizek-sobre-batman-o-cavaleiro-das-trevas-ressurge/). Existe um caminho que perpassa o pano de fundo do filme que vai dar nos
quadrinhos. Sua releitura, sua adequação à realidade social, sua
adequação ao produto da Industria Cultural. O derrapar de Slavoj
encontra-se exatamente em não perceber essa rede discursiva e mirabolar
pretensões discursivas.
Mas
acredito que por mais competente que seja o Slavoj (principalmente com
Pervert´s Guide to Cinema), sua atual análise tropeça na concepção de
pretensão do Nolan, de sua produção e do mercado. Buscar uma reflexão de
profundidade política nunca foi a
pretensão de Nolan, do filme ou mesmo do mercado. E os discursos
fechados são falas apenas do ponto de vista do Slavoj, não sendo, de
forma alguma, determinantes nas produções em questão.