sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Escolas clássicas de armas do Japão




O Arquipélago japonês possui uma longa história com a marcialidade, por conta, principalmente, de sua relação histórica e sócio-econômica com a China. Vários elementos culturais chineses eram importados ao Japão e, então, compatilibizado e reestruturado à sua sociedade e política. O xamanismo tradicional do Japão e o budismo trazido da China foram suas principais bases filosóficas aos seus sistemas de luta.
Desde o século XII, com uma elevada relação diplomática com a China, seu mundo social e econômico foram reflexos reelaborados de suas necessidades. Nos séculos seguintes, o Japão foi um mundo em constante guerra, batalhas entre chefes militares locais chamados Daimios. Uma nação tão mergulhada em pequenos conflitos regionais se moldaria uma nação de guerreiros especializados. Essa especialização também foi aprendida dos moldes chineses, mas nas terras nipônicas ganhou uma singularidade sem igual.
O complexo conhecimento sobre sistemas de luta no Japão ganhou o nome de Bujutsu, ou “virtudes marciais”. Sua figura central é o Bushi, literalmente “guerreiro”, e este assimilava conhecimentos sobre armas de diversas naturezas e combates desarmados. Quando o Bushi se especializada e concentrava seus serviços a um senhor local, isso a partir do século XII, ganhava o nome de Samurai, do antigo japonês saburai, “aquele que serve”.
Com sua origem ligada à guerra e combate entre indivíduos, o Bujutsu tem em sua base de idealização a morte de seu adversário. O treinamento e as suas técnicas eram rigorosos e direcionados a essa meta. Mas através dos conceitos do Budismo esotérico, concepção de elementos chineses como o Yin e o Yang e os cinco elementos tradicionais, a conduta do Samurai não limitava seus estudos apenas à marcialidade. Era preciso também, além das habilidades com o Arco, a espada, a lança e outras armas, o conhecimento sobre música e a cerimônia do chá, adaptações ocorridas após o extenso período de guerras na unificação do Japão pelo shogunato de Tokugawa.
O Budismo Zen, compatibilização japonesa do budismo Chan, do mestre Bodhidarma, influenciou, a todo momento, as mudanças ocorridas no pensamento social desde o homem do campo até a elite samuraica. A “espada e o Zen” caminharam juntos, formando um novo tipo de pensamento que encontrou seu ápice no século XVII, no período denominado Edo, por conta da nova localização da capital do poder central, entre 1603 a 1867. O Bujutsu perderá a expressão “habilidade, arte” de seu nome e tornar-se-á Budô, o “caminho da marcialidade”. A idéia de Dô será oriunda do conhecido Tao dos chineses, energia universal formadura das coisas.
Dessa maneira, as artes marciais, inicialmente as japonesas, passarão por uma importante transformação. Após um turbulento período de guerras e conflitos, o clã Tokugawa assume a liderança do país, reduzindo o poder dos Daimios e trazendo um período de paz que possibilitou a dedicação às artes refinadas, principalmente para a classe guerreira. O conhecimento de arranjos florais, da cerimônia do chá e da caligrafia se fizeram importantes da formação do homem japonês. Da mesma maneiras, sutilezas espirituais ganharam espaço no mundo simbólico das artes marciais. O Budô, escrito com os mesmos caracteres chineses de “parar duas lanças”, incorporaria concepções pacifistas. Na passagens dos séculos XVII para o XVII, era cada vez mais comum o uso de espadas de madeiras, feitas com pesados carvalhos, para serem utilizadas nos treinos, evitando acidentes entre os praticantes. Entre o século XVIII e XIX, a Boken, essa espada de madeira bruta, seria ainda substituída pela Shinai, uma arrumação de bambu específica para combates menos danosos. A arte do espadachim deixará, então, de ser um meio de sobrevivência para se tornar um caminho de iluminação espiritual. A desmilitarização do período Edo dará forças a essas mudanças, nascendo dois outros processos nos sistemas de luta: a especialização e a competição. É de grande dificuldade dizer onde as mudanças nos sistemas de luta são reflexões das mudanças sociais no momento histórico.
A restauração Meiji acarreta em novas mudanças nos sistemas de luta, armados e desarmados, do Japão, em 1867. Líderes militares do Japão perceberão atrasos militares e tecnológico de suas forças, deixando o Japão abaixo do nível de poder das outras nações. Entre as reformas do imperador Meiji, as que mais se destacam enquanto significativas para a vida do guerreiro são o desarmamento dos Samurais, que causou revoltas e insurreições, e a criação de uma força policial nacional que ocupou o antigo papel da casta guerreira.
Até o século XIX o Japão conhecia sistemas de lutas de agarramento, lançamentos e chaves chamados Ju-Jutsu, que posteriormente chamar-se-ão Jiu-Jitsu. Um estudioso da marcialidade, Kano Jigori, assimilou valores culturais, compatibilizou com a educação vigente do período e em 1882 criou o Judô. Suas raízes estão no Ju-Jutsu, mas seu sentido muda de um sistema de uso para o combate bélico para o combate espiritual, acrescentando o “caminho” a sua nomenclatura. Seu currículo de técnicas e métodos foi denominado Kodokan Judô. Da mesma forma ocorreu com o sistema de luta japonês que utiliza técnicas de chave através de movimentos circulares estudados minuciosamente, o Aiki-ju-jutsu. Com o passar do tempo, e as nuances sociais envolvidas na desmilitarização de uma classe guerreira, assimilou o conceito de “caminho” e tornou-se o que conhecemos por Aikidô. Foi na busca de benefícios sociais que Ueshiba Morihei formulou o Aikidô como uma arte marcial suave, porém poderosa de contra-ataques.
Enfim, muitas artes marciais acabaram ganhando suas versões espiritualizadas, concentradas em conceitos filosóficos necessários para a construção de um homem marcial equilibrado. Essa tendência ocorreu de forma inversa na China, mas no fim das contas essas estruturas marciais encontraram semelhanças. E foram esses os novos caminhos das artes marciais até os dias de hoje.

Sávio Roz

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